Com aval do governo, bancos fecham agências e demitem mais de 10 mil trabalhadores
08/02/2021 - Por Bancários CGR
Só em 2020, os três maiores bancos brasileiros fecharam mais de 1.500 agências, número que deve aumentar em 2021. Com menos agências, atendimento à população de menor poder aquisitivo fica mais restrito
Os três maiores bancos brasileiros (Itaú-Unibanco, Bradesco e Santander) ignoram a responsabilidade social e demitem mais de 10 mil trabalhadores em plena pandemia do novo coronavírus, que agravou a crise econômica e provocou o desemprego de mais de 14,1 milhões de brasileiros.
Só em 2020 foram, mais de 1.500 agências extintas. Quem mais sofre é a população de bairros e de municípios mais distantes que ficam sem acesso à agência e têm de se deslocar a outros munícipios ou bairros.
A decisão dos banqueiros segue o padrão de manter, em sua maioria, agências em locais onde há grande circulação financeira ou atividade econômica.
A justificativa, no entanto, é a de que o “futuro é digital” e eles pretendem investir nesta forma de auto atendimento, que têm foco em operações feitas pelos aplicativos nos celulares e computadores pessoais, ou seja, pelos próprios clientes.
Os bancos também alegam que o processo faz parte de reestruturações que têm como objetivo eliminar despesas com imóveis, unificando agências que sejam próximas umas das outras.
“Não há outra explicação a não ser uma uma ganância pelos lucros e para isso, o corte de gastos”, protesta Juvandia Moreira, presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Ramo Financeiro (Contraf-CUT).
Essa economia tem sido prejudicial à sociedade tanto por restringir e dificultar o acesso da população aos serviços bancários como por demitir trabalhadores, aumentando o desemprego no Brasil e sobrecarregando os trabalhadores que ficam nas agências, argumenta Juvandia, que destaca que os bancos deveriam cumprir seu papel social.
Os bancos usam de concessão pública com autorização do Estado pra lidar com o dinheiro das pessoas, por isso têm uma responsabilidade social, papel que eles não cumprem. Ao invés de fechar agências, deveriam ampliar a bancarização, para atender à população
A dirigente lembra que, durante a pandemia do novo coronavírus, houve um aumento das transações digitais, mas ao mesmo tempo o que se viu, em especial nos bancos públicos, foi o aumento de filas com pessoas que procuravam o atendimento presencial.
“Ficou bem clara a importância do atendimento dos bancos durante a pandemia. A Caixa, por exemplo, teve papel fundamental para o pagamento do auxílio emergencial e o Banco do Brasil para socorrer pequenas empresas”, diz a presidenta da Contraf-CUT, lembrando que quanto mais agências com mais funcionários, menor é a aglomeração de pessoas.
Sobrecarga
A redução do número de trabalhadores provoca acúmulo de trabalho para aqueles que ficam, que têm que assumir o trabalho que antes era feito pelos colegas.
“Quando um gerente de contas é demitido, outro vai ter que ficar com a carteira dele e ligar para todos esses clientes todos os meses. E ele não dá conta. É impossível”, relata Juvandia.
Atendimento excludente
O fechamento de agências também segue uma outra característica – a localização geográfica. Juvândia ressalta que a maior parte das agências extintas estão em locais mais distantes, nas periferias ou onde a atividade econômica não é tão presente.
“As agências que estão ficando, são localizadas em centros financeiros ou em bairros mais desenvolvidos economicamente”, diz a presidenta da Contraf-CUT.
Outra parte das agências sobreviventes preservam também a característica de atendimento personalizado, mais voltado a clientes de maior poder aquisitivo, como Prime no Bradesco, Personalité no Itaú e Van Gogh no Santander.
Juvândia volta à responsabilidade social para avaliar a atuação dos bancos. ”Eles usam da concessão pública para selecionar o atendimento a quem tem poder aquisitivo maior, mas deveriam estar presentes em um número maior de locais e pensando em assistência à população”, diz.
Ela afirma ainda que as instituições “têm um número grande de agências rentáveis que compensam economicamente as agências menores e mais distantes, que os bancos não consideram lucrativas, mas que são justamente aquelas que a população de baixa renda necessita.
Responsabilidade do Estado
Outro problema apontado por Juvândia é a omissão do Governo Federal no controle do sistema financeiro.
“O Banco Central é o órgão controlador do sistema financeiro e permite que os bancos fechem agências durante a pandemia, mesmo causando prejuízos aos clientes, de ter que se deslocar a um lugar mais distante e de municípios que ficarão desassistidos. O Governo Bolsonaro que está permitindo isso”.
No caso dos bancos públicos, diz Juvândia, fechar agências é uma ação direta do governo e no caso dos bancos privados, há a conivência do governo, por meio do Banco Central.
Nos bancos privados
Mesmo em ano de pandemia a rentabilidade dos três maiores bancos privados variou entre 14,8% e 19,1%.
O Bradesco, cujo lucro líquido em 2020 foi de R$ 19,4 bilhões, fechou 1.083 agências em 2020 e anuncia o fechamento de pelo menos mais outras 300 para este ano. No total, 7.754 postos de trabalho foram extintos no ano passado. Os dados foram levantados pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) com base no balanço apresentado pelo Bradesco
A coordenadora da Comissão de Organização de Empresas (COE) Bradesco, Magaly Fagundes reforça que a população é diretamente afetada pela situação, pois menos agências e menos trabalhadores significa superlotação, bancários sobrecarregados.
“Isso influi diretamente no atendimento aos clientes. Muitos clientes terão de realizar um deslocamento muito maior para encontrar um local de atendimento”, diz.
O Itaú-Unibanco, maior instituição brasileira, teve o segundo maior lucro líquido em 2020, entre os bancos privados. O total foi de R$ 18,9 bilhões. O banco fechou 117 agências no ano passado..
No 4° trimestre de 2020, o Itaú tinha 353 empregados a menos que no trimestre anterior, mas no balanço do ano, o saldo de postos de trabalho ficou positivo porque o total de trabalhadores do banco passou a contabilizar também os empregados da ZUP, empresa de tecnologia adquirida pelo banco em outubro de 2019.
Para Jair Alves, coordenador da Comissão de Organização dos Empregados (COE) do Itaú, “ lucro do Itaú prova que o sistema financeiro continua rentável no Brasil e não há motivo para demissão de seus trabalhadores, mas sim a necessidade de aumentar o nível de emprego na categoria”.
O Santander foi o banco que teve maior rentabilidade. A variação do lucro líquido subiu 19,1%. O lucro líquido em 2020 foi de R$ 13,8 bilhões. Ainda assim, fechou 175 agência e 3.220 postos de trabalho.
Para a coordenadora da Comissão de Organização dos Empregados (COE) do Santander, Lucimara Malaquias, funcionários e clientes são os mais prejudicados com a diminuição de trabalhadores e fechamento de agências.
“O serviço fica precarizado e as filas aumentam”, diz.
Nos bancos Públicos
Dados compilados pelo Dieese relativos ao período de janeiro até setembro de 2020, mostram que, juntos, Caixa Federal e Banco do Brasil fecharam 2.562 postos de. O lucro somado das duas instituições no mesmo período foi de R$ 17,5 bilhões.
O Banco do Brasil enfrenta um processo de reestruturação que prevê o fechamento de mais de 361 agências e postos de atendimento em todo o país, além da demissão de cinco mil trabalhadores. O coordenador da Comissão dos Empregados do Banco do Brasil (CEBB), João Fukunaga, reforça a população, em especial de pequenas cidades e das periferias, fica prejudicada pela falta de acesso aos serviços bancários.
“Hoje, 41,9% dos municípios não têm agência bancária e entre os que possuem, 17% só tem uma agência que é de banco público. O Banco do Brasil tem papel estratégico e a reestruturação pretendida pelo banco tem como objetivo somente aumentar o lucro dos acionistas”, ele diz. O Banco do Brasil é um banco de economia mista, cujo maior acionista é o Estado brasileiro.
Fukunaga também rebate o argumento de que a digitalização é o futuro próximo dos serviços bancários. “ Todas as justificativas sobre a digitalização remetem à pandemia. Durante o período houve um incentivo à utilização, porque as pessoas precisavam evitar aglomerações, sair de casa, mas mesmo assim, em qualquer agência do BB, você vai encontrar uma fila de pessoas que precisam de atendimento. Na Caixa também”, ele explica.
A realidade do Brasil, ele diz, é que grande parte da população não usa os recursos digitais dos bancos ou por medo de falhas na segurança ou porque não têm crédito no celular. “Se você sair das grandes cidades, o problema se agrava porque o acesso à internet é precário. Milhões de brasileiros sequer têm esse acesso”
De acordo com dados da Pesquisa TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil, em 2019, um em cada quatro brasileiros não acessam a internet. Isso representa um total de 76 milhões de pessoas.
*Edição: Marize Muniz com Portal CUT