Cresce desigualdade salarial entre homens e mulheres com maior formação
06/01/2014 - Por Bancários CGR
A diferença salarial entre homens e mulheres mais qualificados e em vagas com maior remuneração ficou maior nos últimos anos. Em 2012, as mulheres com mestrado empregadas no mercado formal de trabalho ganharam em média 50% menos que homens com o mesmo nível de instrução. Em 2007, tal hiato era bem menor: de 35,3%. Dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), mostram que enquanto as profissionais femininas registraram remuneração média de R$ 4.827 no ano passado, os homens de mesma formação recebiam R$ 7.241.
De 2007 para 2012 também cresceu a discrepância salarial entre homens e mulheres empregados com doutorado, que passou de 21,5% para 27,24%. Nas faixas mais qualificadas, o único nível em que houve recuo na diferença salarial foi no nível superior completo. A notícia, no entanto, não chega a ser boa para a valorização da qualificação feminina já que o hiato ainda é brutal: as mulheres com graduação ganhavam 65,7% menos que os homens em 2012, ante diferença de 77,8% em 2007. Na média do mercado de trabalho, a relação salarial homem/mulher ficou quase estável: era de 20,8% e passou a 21,63%.
Na avaliação de pesquisadoras ouvidas pelo Valor, o retrato da mulher no mercado de trabalho brasileiro é similar ao que acontece no mundo: embora sejam maioria entre os empregados com mestrado, as mulheres continuam a ocupar menos cargos de chefia e comando nas empresas, que oferecem os melhores salários.
Além desse fator "cultural", a geração recente de vagas no Brasil, concentrada em serviços que pagam menos, não favoreceu as mulheres, observam as especialistas. Uma terceira razão para a piora na desigualdade é ainda mais perversa: há mais mulheres que homens com mestrado e doutorado.
"Os retornos da escolaridade maior são muito menores para as mulheres", diz a professora Lena Lavinas, pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que avalia que, no Brasil, o perfil da forte criação de vagas dos últimos anos não favoreceu a redução do desequilíbrio salarial entre homens e mulheres.
Na última década, diz ela, a geração de empregos formais foi mais concentrada em vagas de nível de instrução médio e menos expressiva nas faixas de nível superior completo, onde estão concentrados os cargos de gerência e chefia, mais disputados e escassos. "Nós criamos 18 milhões de postos de trabalho desde 2003, porém 90% disso foi na faixa de até três salários mínimos. Não estamos criando oportunidades para pessoal mais qualificado. Quando há menos vagas de maior remuneração e mais competidores, quem é desfavorecida é a mulher", afirma Lena.
A barreira velada que dificulta a chegada das mulheres aos cargos de comando nas empresas é o que as pesquisas de gênero chamam de "teto de vidro", combinação que envolve sobrecarga de trabalho, rotina doméstica e cuidado com os filhos - já que tais afazeres ainda são considerados responsabilidades preponderantemente femininas - com a cultura em grande parte das empresas que associa a imagem feminina à menor aptidão para liderança, menos afinidade com a tecnologia e menor disponibilidade de agenda para o trabalho.
"Está ligado a estereótipos, questões ideológicas difundidas por todo lado segundo as quais as mulheres não têm jeito para mandar, preferem posições mais discretas. Como se as mulheres e o poder fossem uma relação antagônica, excludente", explica Helena Hirata, pesquisadora do Centre National de la Recherche Scientifique, na França, especializada em comparações das relações de gênero no trabalho no Brasil, França e Japão.
"Nas indústrias que são consideradas masculinas, as mulheres são pouco recrutadas e restritas a setores muito demarcados. Os mais tecnológicos, que pagam mais, ficam com os homens", diz Helena, que afirma que a desigualdade salarial em desfavor das mulheres é realidade no mundo todo. "Não há nenhum país em que as mulheres em funções iguais ganhem igual ou mais que os homens; sempre ganham menos".
A multiplicação da oferta de profissionais com mestrado desfavoreceu as mulheres na questão salarial, diz a economista Hildete Pereira de Melo, professora da Universidade Federal Fluminense (UFF) especializada em questões de gênero e assessora especial da Secretaria de Política Públicas para as Mulheres, do governo federal. "Quando havia menos profissionais com mestrado, entrava o mais competente. À medida que você tem abundância de mão de obra com essa formação, prevalece a ideia da supremacia masculina", afirma.
Em 2012, nos dados da Rais, o número de mulheres com mestrado em empregos formais era maior que o de homens e crescia em ritmo mais forte. O estoque de empregos ocupados por mulheres com mestrado cresceu 16,55% sobre 2011, enquanto as vagas para homens com mesma instrução cresceram 12,52%. Eram 114, 9 mil mulheres com mestrado empregadas no ano passado, ante 90,6 mil homens.
"Na medida em que as mulheres se educam, a diferença salarial entre elas e os homens é cada vez maior. Você vai caminhando na carreira, mas chega uma hora em que se depara com a porta fechada, que você não vê, mas não se abre", explica Hildete, da UFF, que destaca que salário igual para homens e mulheres em funções equivalentes já era uma bandeira do feminismo nos 70.
Outro fator que influencia o hiato de renda entre os gêneros é a concentração das mulheres em áreas que pagam menos, associadas aos tipos de trabalho que por décadas as mulheres realizavam sem remuneração: educação, cuidados com saúde, ensino infantil.
"Elas tendem a se concentrar em áreas onde elas vão poder adequar suas necessidades de tempo familiar com o trabalho", diz Lena Lavinas. "As mulheres estão muito presentes no funcionalismo público, no mundo inteiro, porque é mais flexível. Você consegue entrar pela competência, por concurso, e consegue gerir seu tempo, se precisar faltar depois você compensa".
A pesquisa "A Mulher no Mercado de Trabalho", divulgada em 2012 pelo IBGE, mostra que em 2011 a maioria das mulheres ocupadas estava na área de administração pública (22,6%), seguida por comércio (17,5%) e serviços (16,2%), composição similar à observada em 2003. Só 13% delas estavam na indústria, contra 19,3% dos homens empregados.
Fonte: Ligia Guimarães - Valor Econômico