Greve dos entregadores de aplicativo tem apoio internacional
01/07/2020 - Por Bancários CGR
A categoria tem consciência da exploração e do papel social e, neste mundo globalizado e com uma interação maior até pela exigência da profissão em se manter conectado, as trocas de experiências se tornam mais rápidas e a identificação de propósitos também, analisa o secretário de Relações Internacionais da CUT, Antonio Lisboa, se referindo aos apoios que os brasileiros estão recebendo.
“É uma tomada de consciência da exploração a que estão submetidos, por isso a greve é extremamente positiva e tem recebido apoio de trabalhadores e das entidades que os representam como é o caso da CSA que enviou uma carta de solidariedade aos entregadores brasileiros”, diz Lisboa.
Outro comunicado de apoio à greve dos brasileiros partiu de entregadores por aplicativos da Argentina, Chile, Costa Rica, Equador , Guatemala e México que reforçaram a unidade da luta em prol de melhores condições de trabalho, principalmente diante da pandemia.
Milhares de pessoas em todo o mundo passaram a trabalhar neste sistema criado por grandes corporações internacionais que ganham milhões de dólares sem dar praticamente nada em troca. E foi justamente a crescente exploração durante a pandemia do novo coronavírus (Covid 19), período em que milhares de desempregados recorreram aos aplicativos para sobreviver, que uniu esses trabalhadores.
Embora em alguns países como França e Inglaterra e alguns estados dos Estados Unidos, como a Califórnia, tenham uma regulamentação da profissão, no mundo inteiro o trabalho dos entregadores por aplicativos é precarizado, diz o professor do Departamento de Prática Jurídica e Coordenador da Clínica de Direito do Trabalho da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Sidnei Machado.
O professor atuou no projeto da UFPR que resultou na pesquisa da Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista (Remir), que mostrou que os entregadores por aplicativo tiveram durante a pandemia aumento da jornada de trabalho, mas o rendimento, ao contrário, caiu.
“O protótipo de trabalho precário é modelo dessas empresas que são capitalistas globais. Elas acabam promovendo o entendimento do trabalhador de que ele é autônomo, mas que na verdade não é. E como o lobby dessas empresas, tanto aqui como no exterior, é muito poderoso, dificilmente haverá uma regulamentação da profissão”, diz Machado.
Embora a solução para uma regulamentação por Lei fosse o ideal para incluir direitos aos entregadores, o professor de Direito vê ainda como empecilho o governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL).
“Os projetos não têm hoje a menor chance de tramitar no Congresso. Além do lobby imenso das empresas, temos um governo que está desregulamentando o trabalho, ao invés de proteger os direitos dos trabalhadores”.
No entanto, Machado, diz que a primeira greve dos entregadores por aplicativo no país só pode ser chamada de greve e não de paralisação, e pelo fato deles tirarem uma pauta de reivindicações por melhores condições de trabalho, torna relevante o movimento.
“A greve é necessária para dar visibilidade à demanda de uma categoria que está prestando um serviço público essencial para dar mais eficácia ao isolamento social diante da pandemia”, diz.
O professor de Direito do Trabalho aponta que um dos entraves à maior organização da categoria é a sua heterogeneidade. São motoboys que estão no mercado há mais de 20 anos, jovens que não conseguem entrar no mercado de trabalho, ex- seguranças, trabalhadores do comércio, entre outras profissões, gente da periferia e da classe média que não tem perfil tradicional de trabalhador.
Para Machado, essa gama de diferentes idades, profissões e classe social acaba também por ajudar no imaginário dos entregadores de que ter carteira assinada vai ter mais custos com encargos trabalhistas, embora não dispensem a proteção jurídica.
“Em geral os antigos motoboys tem um sentimento mais de categoria, mas a imensa maioria dos jovens não se apresenta como motoboy, não tem identidade com a profissão, pois está lá enquanto não arruma emprego melhor”, afirma Sidnei Machado.
Além disso, prossegue o professor, há a racionalidade econômica liberal dos entregadores que acreditam que ter direitos vai obrigá-los a bater ponto. É uma cultura de trabalho precário.
“Uma das demandas da greve é contra o modelo de pontuação, que privilegia os que trabalham maior tempo e em horários de menor oferta como aos domingos e madrugada. Isso é um dado novo provocado pela pandemia. As empresas tem maior demanda de trabalho e passaram a exigir uma fidelização maior deles, mais tempo logado e horários inóspitos de trabalho. Eles não têm flexibilidade de jornada, trabalham sem descanso. Essa autonomia não existe”, diz o professor da UFPR.
Fonte: Contraf-CUT