OAB lança manifesto contrário ao PL 4.330 da terceirização
10/09/2013 - Por Bancários CGR
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio de deliberação do Plenário do seu Conselho Federal, "manifesta a sua posição contrária à aprovação, em concreto, do Projeto de Lei nº 4.330/2004". A manifestação se deu por meio de nota técnica em que a entidade expõe suas contrariedades em relação ao projeto ora em discussão na Câmara dos Deputados.
"Resta evidente que o PL 4.330 caminha em sentido contrário ao das conquistas democráticas recentes, ao precarizar o vínculo empregatício e retirar dos trabalhadores relevantes porções das garantias estipuladas pela Consolidação das Leis do Trabalho e pela Constituição Federal, como também enfraquece os poderes de organização e negociação coletivas", diz a nota técnica.
"A lógica do projeto envolve a transformação da força do trabalho humano em mercadoria negociada entre a empresa que, ao final, auferirá os lucros com a atividade produtiva, e outra empresa que desenvolverá a função de intermediária da prestação de serviços, retirando seus rendimentos não da produção, mas da comercialização da força de trabalho. Trata-se de norma que, se aprovada, incorrerá em graves prejuízos sociais e em sérias violações à Constituição Federal, em nítida afronta ao Estado democrático de direito", critica.
Na nota, a entidade expressa que "é necessário atentar para o fato de que as garantias trabalhistas se voltam, sobretudo, a balancear uma relação por essência desequilibrada entre trabalhadores e detentores do poder econômico. Um país democrático deve lutar para que essa relação seja cada vez mais equânime, tendo em vista a necessária materialização do objetivo constitucional de redução das desigualdades sociais."
Leia a íntegra da nota técnica:
COMISSÃO NACIONAL DE DIREITOS SOCIAIS DA OAB
NOTA TÉCNICA PELA REJEIÇÃO DO PROJETO DE LEI Nº 4.330/2004
Embora o tema da "terceirização" em si mereça um debate mais intenso e, para um pronunciamento oficial da entidade, dependa de discussão e deliberação do Plenário do Conselho Federal da OAB, a Comissão Nacional de Direitos Sociais (CNDS/CFOAB), órgão fracionário do Conselho, específico quanto a essa temática, manifesta a sua posição contrária à aprovação, em concreto, do Projeto de Lei nº 4.330/2004, atualmente sob apreciação conclusiva na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), da Câmara dos Deputados, incluído na pauta de votação do dia 4 de setembro de 2013.
Referido projeto, seja em seu texto original, seja no substitutivo apresentado à deliberação da CCJC, tem por objetivo expandir, de modo indiscriminado, as possibilidades de terceirização do trabalho, atualmente reguladas pela Súmula nº 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que a admite apenas para a realização de atividades-meio, desde que inexistentes a pessoalidade e a subordinação direta.
A lógica do projeto envolve a transformação da força do trabalho humano em mercadoria negociada entre a empresa que, ao final, auferirá os lucros com a atividade produtiva, e outra empresa que desenvolverá a função de intermediária da prestação de serviços, retirando seus rendimentos não da produção, mas da comercialização da força de trabalho. Trata-se de norma que, se aprovada, incorrerá em graves prejuízos sociais e em sérias violações à Constituição Federal, em nítida afronta ao Estado democrático de direito.
O alijamento jurídico da estrutura orgânica da unidade produtiva principal debilita consideravelmente o padrão protetivo dos trabalhadores. A terceirização não eleva a oferta de emprego, apenas transfere e precariza os postos de trabalho já existentes. O trabalhador sofre com o incremento da rotatividade de mão-de-obra e com a redução das retribuições trabalhistas.
Ao fomentar a intermediação de mão-de-obra, de forma indiscriminada, o PL 4.330/2004 contraria o princípio constitucional da valorização social do trabalho, promovendo a segregação de trabalhadores, em oposição ao posicionamento já consolidado nos tribunais brasileiros, a respeito da necessária restrição do contrato de prestação de serviços às atividades acessórias.
Não bastasse isso, a proposição atenta contra o princípio constitucional do concurso público, já que admite que empresas públicas e sociedades de economia mista firmem contratos de prestação de serviços com vistas a suprir força laboral para sua atividade-fim, algo que tem sido repetidamente condenado pelo Poder Judiciário e pelos órgãos de controle da Administração Pública, sobretudo em nome da moralidade pública, princípio do qual será um risco dele abdicarmos. Será risco a todos nós, inclusive a esse Parlamento.
A condição de insegurança dos trabalhadores, no contexto do referido PL, é aprofundada pela estipulação da responsabilidade subsidiária da empresa tomadora de serviços como regra nos casos de inadimplemento das prestações trabalhistas e afins.
O cotidiano da Justiça do Trabalho no julgamento de causas que envolvem a responsabilidade subsidiária comprova facilmente que aquilo que parece ser, em princípio, uma garantia ao empregado, é antes um meio de dificultar o cumprimento dos direitos deste. É que, antes de acionar judicialmente a tomadora, o empregado sempre terá que ingressar em juízo contra a prestadora de serviços, o que restringe sobremaneira o acesso à justiça, eterniza a duração dos processos judiciais e, não raramente, impede a celeridade da execução judicial, o que aumenta os custos para o Estado, porém, também, para as empresas pelo aumento do custo do processo.
No que tange à representação sindical, o projeto é igualmente problemático. Contrariando as orientações da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e as previsões constitucionais sobre a matéria, o PL 4.330 amplifica a pulverização da representação obreira, assim como multiplica a quantidade de empregadores com os quais os sindicatos de trabalhadores deverão negociar. Tal iniciativa estimula práticas antissindicais, na medida em que empregadores podem se valer da condição precária e fragmentada de trabalhadores submetidos à terceirização para reduzir custos em processos de negociação coletiva.
Por fim, é necessário atentar para o fato de que as garantias trabalhistas se voltam, sobretudo, a balancear uma relação por essência desequilibrada entre trabalhadores e detentores do poder econômico. Um país democrático deve lutar para que essa relação seja cada vez mais equânime, tendo em vista a necessária materialização do objetivo constitucional de redução das desigualdades sociais.
Nesse particular, deve-se destacar que o princípio protetivo está no cerne do Direito do Trabalho no Brasil, como se pode depreender da leitura de todo o capítulo sobre direitos sociais da Constituição Federal. E o elemento "proteção" não existe como "benesse", mas como indispensável princípio que emerge na sociedade, sobretudo a pós-moderna, que encontrou e fixou novos valores, entre os quais a solidariedade social, que tem como um dos seus alicerces a função social dos contratos, que favorece a todos os alcançados pelo conceito de "vulneráveis", entre eles os trabalhadores, os consumidores, os idosos etc.
Resta evidente que o PL 4.330 caminha em sentido contrário ao das conquistas democráticas recentes, ao precarizar o vínculo empregatício e retirar dos trabalhadores relevantes porções das garantias estipuladas pela Consolidação das Leis do Trabalho e pela Constituição Federal, como também enfraquece os poderes de organização e negociação coletivas.
Sendo assim, apesar de ainda pendente deliberação final do Plenário do Conselho Federal da OAB, a Comissão Nacional de Direitos Sociais (CNDS), após reunião formal e consultados os seus membros, decidiu dentro da sua restrita competência que, pelas razões e fundamentos aqui ofertados, merece ser rejeitado nessa comissão congressual, que é o órgão, por excelência, responsável por fazer com que as proposições legislativas ordinárias resguardem os direitos firmados pelo regime constitucional inaugurado em 1988.
Esse é, ad referendum do Plenário do Conselho Federal, o pronunciamento técnico da Comissão Nacional de Direitos Sociais (CNDS/CFOAB) contrário a aprovação do PL 4.330.
Brasília, DF, 3 de setembro de 2013.
NILTON CORREIA
Presidente
MAURO DE AZEVEDO MENEZES
Membro Consultor
Fonte: OAB