O Seminário Adoecimento Psíquico no Trabalho Bancário, organizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), marcou, nesta quinta-feira (28), o Dia Internacional em Memória das Vítimas de Acidentes de Trabalho. O evento foi destinado a dirigentes e assessorias técnicas e políticas sindicais, para o aprofundamento e a difusão dos conceitos relacionados a esse problema de saúde na categoria.
Debate importante
O secretário de Saúde da Contraf-CUT, Mauro Salles, destacou a relevância do debate para a categoria bancária, em um seminário que marca a data escolhida no mundo inteiro para lembrar das trabalhadoras e dos trabalhadores vítimas de acidente de trabalho e doenças profissionais ou relacionadas a trabalho. “É um evento para lutar por melhores condições de trabalho, para que perdas humanas não voltem jamais a acontecer, não voltem a ser toleradas, nem que sejam naturalizadas pela sociedade, pelos empregadores e pelo governo, como algo normal, inerente ao trabalho ou, como eles dizem, o preço do progresso, entre outras falácias”, afirmou Mauro.
“Durante o seminário abordamos suicídios, tentativas de suicídios, síndrome de burnout, que acometem cada vez mais a categoria e podem ser evitados. A maioria dessas mortes, dessas doenças, poderia ser evitada na sua causa, a organização do trabalho. Este é o grande debate para buscar medidas que contenham essas tragédias cotidianas que temos na categoria. Esse mecanismo adoecedor das empresas, e principalmente dos bancos, precisa ser contido com a nossa luta sindical”, completou o secretário.
Saúde mental
A presidenta da Contraf-CUT, Juvandia Moreira, observou que este ano haverá negociações para a renovação das convenções coletivas e dos acordos coletivos, e que “o tema da saúde tem destaque na Campanha Nacional há bastante tempo, por conta do adoecimento que a gente percebe na categoria bancária”. Ela lembrou que “inicialmente eram as lesões por esforços repetitivos, aí vieram os transtornos mentais, que hoje são a maioria dos problemas de saúde da categoria, e isso tem a ver com a pressão, com a cobrança de metas, com a forma de gestão”.
Para Juvandia, é por isso que “o seminário vem num momento bastante oportuno, quando estamos começando a nossa campanha, a preparação do que nós vamos negociar; e aqui debatemos o que temos de reivindicar, o que é necessário implementar em termos de cuidado com a saúde mental da categoria”.
Suicídio na categoria bancária
Depois da transmissão do documentário 4 contos – A tragédia por trás do lucro, produzido pelo Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região, o diretor do documentário, Marcelo Monteiro, e o psicólogo, doutor em psicologia social e institucional, André Guerra, debateram o tema.
Para Monteiro, a discussão da saúde mental extrapola a categoria. “Hoje, a gente vê que esse problema está atingido muitas categorias. Eu mesmo enfrentei e ainda me trato contra depressão, ansiedade e pânico, em razão de um problema que tive em 2015. Essa coisa da identificação foi muito forte comigo ao colher esses relatos [do documentário], pois quem passou ou passa por esse problema, consegue entender melhor a gravidade, ver o grau que essa doença afeta a vida das pessoas”.
Conforme o diretor do documentário, “existe uma visão distorcida da sociedade em relação à categoria bancária. As pessoas acham que o bancário é um privilegiado, por ganhar um salário acima da média e ter bons benefícios, quando na verdade está sendo explorado ao máximo possível, quase como uma ponta de lança do capitalismo. É onde o capitalismo testa os limites das pessoas”.
André Guerra iniciou sua fala numa tentativa de sensibilizar as pessoas para a importância de se discutir o suicídio. “Acredito que este é o principal ponto do documentário: precisamos sair deste seminário com a convicção de que a gente precisa debater a questão, não só na categoria bancária, que sofre muito com as tentativas de suicídio, mas o problema é muito maior”, afirmou.
O psicólogo alertou ainda para a necessidade de revisitar a forma como a sociedade se posiciona diante do suicídio. “A forma tradicional de se compreender o fenômeno não dá conta de compreender sua efetiva realidade; e assim também não vai dar conta de intervir, solucionar ou amenizar este problema”, advertiu. Para ele, exatamente por isso, iniciativas concretas precisam ser implementadas, “para que sejam desenvolvidas formas eficazes e efetivas de intervenção, o que vai ser vital na nossa capacidade de intervir em casos de pessoas que estão sofrendo”.
Silêncio e conivência levam à síndrome de burnout
O psicólogo, psicoterapeuta humanista e existencial Rui Carlos Stockinger, da Universidade Católica de Petrópolis (RJ), apresentou alguns dados da pesquisa que está desenvolvendo, em parceria com a Contraf-CUT. O estudo tem por objetivo de compreender melhor os fatores associados à síndrome de burnout, em busca de ampliar a possibilidade de diagnóstico e de tratamento, além de apontar as causas da ocorrência e contribuir com propostas de cuidados com a saúde da categoria bancária.
A síndrome de burnout – ou síndrome do esgotamento profissional – tem fortes consequências emocionais, com sintomas de exaustão extrema, estresse e estafa física, e é resultante de situações de trabalho desgastante que demandam muita competitividade ou responsabilidade. A principal causa da doença é justamente o excesso de trabalho. A síndrome de burnout costuma ter três características principais: exaustão, menor identificação com o trabalho e sensação da redução da capacidade profissional.
“Um dos principais fatores que me levaram a fazer essa pesquisa é que a prevalência da doença na classe dos bancários é a mais alta entre todas as categorias no Brasil, cerca de 60 a 70%”, revelou Stockinger. “Para mim, isso foi se tornando muito claro quando, ao longo dos anos, eu fui tendo como psicoterapeuta, bancários numa quantidade cada vez maior em situações muito agravadas, com afastamentos longos do trabalho, com comprometimentos importantes na área de identidade e na área dos conflitos de valores, especialmente valores éticos e relacionados ao autocuidado e ao bem-estar pessoal”, completou.
A partir desses dados, o pesquisador destacou o quanto a gestão dos bancos é capaz de “retirar as pessoas delas próprias”. “Eu nunca vi na minha vida, como terapeuta, um adoecimento tão sistêmico como o dos bancários. Nessa categoria, bounout tem um nível de comprometimento sistêmico, profundo e duradouro, e gera outros comprometimentos futuros, como processos depressivos secundários e crises de ansiedade, difíceis de tratamento”, concluiu.
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