Sociedade reage contra redução da maioridade penal

06/07/2015 - Por Bancários CGR

Deputados, magistrados, advogados, governo e secretários de Justiça condenam tanto manobra que aprovou PEC 171 em primeiro turno, na Câmara, como redução em si, de 18 para 16 anos

Um grupo suprapartidário de 60 deputados decidiu, em reunião na tarde de quinta 2, elaborar um mandado de segurança a ser interposto na segunda-feira 6 no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão da sessão que aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171, na Câmara. A PEC trata de redução da maioridade penal dos atuais 18 anos para 16 anos para crimes hediondos.

Além dos deputados, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), quase todos os secretários estaduais de Justiça do Brasil e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, também engrossam o coro tanto contra a forma como a PEC foi aprovada como contra a redução em si.

Os parlamentares também vão estudar uma possível medida judicial, restrita à conduta do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por quebra regimental.

Em paralelo, o grupo vai trabalhar para ampliar a mobilização das entidades da sociedade civil contra a redução da maioridade penal e se articular com o Senado para alterar o teor da PEC, caso não haja mudança na votação em segundo turno na Câmara.

Autoritarismo – Fazem parte do grupo, entre outros, Alessandro Molon (PT-RJ), Glauber Braga (PSB-RJ), Henrique Fontana (PT-RS), Paulo Rocha (PT-SP), Paulo Teixeira (PT-SP), Ivan Valente (Psol-SP), Chico Alencar (Psol-RJ), Jandira Feghali (PCdoB- RJ), Erika Kokay (PT-DF) e Paulo Pimenta (PT-RS). A reunião dos deputados representou uma espécie de guerra declarada ao grupo liderado hoje por Cunha, formado em grande parte pelas bancadas que representam evangélicos e o empresariado.

Segundo Molon, o trabalho dos deputados terá de ir além da questão que envolve a PEC 171. “Vamos mostrar ao STF que o presidente da Câmara está adquirindo o hábito de levar as votações à exaustão, por meio de emendas aglutinativas que são apresentadas e apresentadas até serem aprovadas da forma como ele quer. Se ficar assim, ficará comprovado que, neste parlamento, quem detiver a agenda terá sempre o poder e isso não é compatível com um ambiente democrático”.

Fontana disse que não há mais como admitir a postura de Eduardo Cunha e que o que se viu na última sessão representa forte prática casuística. “O presidente desta casa tem sido muito arrogante na conduta dos trabalhos legislativos e age como quem quer ser o dono do plenário. Só se pode explicar suas atitudes a partir do autoritarismo de quem não é capaz de respeitar um resultado e comete ilegalidades”, ressaltou.

“Se aceitarmos essa interpretação do regimento, estaremos abrindo precedentes onde nunca mais aprovaremos nada que alguns não concordam, porque farão votações intermináveis para atender à vontade deles”, avaliou o atual presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, Paulo Pimenta (PT-RS).

“Golpe” – A manobra de Cunha para aprovar a redução da maioridade foi chamada de golpe pelos deputados contrários à PEC, pois ela havia sido rejeitada na noite anterior, pelo mesmo plenário. Para tal, o presidente da Câmara, notório defensor da aprovação, apresentou emenda aglutinativa modificando o teor do texto rejeitado, o que foi amplamente contestado não apenas pelos deputados como também por outros setores da sociedade.

O presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, também disse que vai recorrer ao STF, caso a proposta seja aprovada pelo Senado. “Constitucionalmente, a matéria rejeitada não pode ser votada no mesmo ano legislativo. A redução da maioridade, que já tinha a inconstitucionalidade material, porque fere uma garantia pétrea fundamental, passa a contar com uma inconstitucionalidade formal, diante deste ferimento ao devido processo legislativo.”

Em nota, a AMB afirma que a alteração é inconstitucional por abolir diretos e garantias individuais. Segundo a entidade, o Artigo 228 da Constituição não pode ser alterado. O texto da norma diz: “São penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial”.

“Esse é mais um retrocesso para a democracia brasileira. O sentimento de todos os operadores do sistema de infância e juventude hoje é de indignação. Buscar a redução da maioridade penal como solução para a diminuição da violência juvenil, sem o profundo e importante debate, trará intangíveis danos à sociedade”, declara a Associação os Magistrados.

Vidas perdidas – O diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Renato Devitto, divulgou outro manifesto contra a medida, assinado por 24 dos 27 secretários de Justiça do país, que será entregue a parlamentares da Câmara e do Senado.

Somente os secretários de São Paulo, Sergipe e Goiás não assinaram.

“Para nós, é muito claro, e praticamente uma unanimidade entre os secretários de Justiça, que não resolveremos a violência urbana apostando no aumento da população prisional. O contingente de adolescentes que requerem um procedimento especial é mais um problema com que nós, gestores, teremos que lidar”, disse Devitto.

Segundo o diretor do Depen, o sistema prisional já tem déficit de 231 mil vagas e, se a proposta for aplicada, “dezenas de milhares de adolescentes” vão entrar nele. Hoje são 607 mil presos para 376 mil vagas. A redução da maioridade penal, segundo ele, aumentaria em cerca de 40 mil o número de pessoas.

O discurso dos secretários e do diretor da Depen coincidem com declarações do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que manifestou preocupação com a medida. Para ele, não há espaço nas prisões para separar os adolescentes do resto da população carcerária, como reza o texto dos deputados. “Até que se criem as vagas para os adolescentes de 16 e 17 anos, eles serão trancados nos presídios atuais e as organizações criminosas vão cooptar esses jovens. E, quando o Brasil acordar disso, já teremos perdido muitas vidas.”

 

 

Fonte: Seeb-SP, com informações da Rede Brasil Atual e Agência Brasil - 3/7/2015

 

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